sábado, 5 de dezembro de 2009

O CORDÃO DOURADO (MITTE) EM APOCALÍPSE

A TEOLOGIA BÍBLICA EM APOCALÍPSE
Introdução
O livro do Apocalipse objetiva ser uma revelação dos eventos que ocorrerão no fim do século e do estabelecimento do reino de Deus. A teologia básica, do livro, portanto, é sua escatologia. Ele declara ser uma profecia das coisas que brevemente têm de acontecer (Ap 1.2,3), cujo evento central é a segunda vinda de Jesus Cristo (Ap 1.7).
A interpretação do Apocalipse tem sido a mais difícil e confusa de todos os demais livros do Novo Testamento. Muitas são as abordagens ao longo da história da interpretação. A mais fácil é seguir sua própria tradição particular, como opinião verdadeira, e ignorar as outras; mas o intérprete inteligente tem que se familiarizar com os vários métodos de interpretação, para que possa criticar e purificar sua própria opinião.[1]


Autoria e Data
O autor se identifica como João (1.1,4,9; 22.8). era bem conhecido entre as igrejas da Ásia Menor (1.9). Já no século II d.C., Justino Mártir, Irineu e outros identificaram o autor como sendo o apóstolo João.
Apocalipse foi escrito durante uma época de perseguição, provavelmente perto do final do reino do imperador Nero (54-68 d.C.) ou durante o reino de Domiciano (81-96 d.C.). Esta data mais recente era sustentada por antigos escritores cristãos como Irineu (c. 130-200 d.C.). Hendriksen diz que “O Apocalipse foi escrito próximo ao reinado de Domiciano, pelo apóstolo João, mas o verdadeiro autor não é João, mas o próprio Todo-Poderoso, Deus” (Ap 1.1). O que Hendriksen quer dizer é que o conteúdo desse livro não é produto de gênio humano, tendente ao erro, mas revelação da mente e do propósito de Deus com respeito à história da Igreja.[2]


Dificuldades de interpretação
Os interpretes discordam com relação ao próprio tempo e à maneira em que as visões de 6.1 – 18.24 são cumpridas. Os “preteristas” pensam que o cumprimento ocorreu na queda de Jerusalém (isto se Apocalipse foi escrito em 67 – 68 d.C.), na queda do Império Romano, ou em ambos. Os “futuristas” acham que o cumprimento ocorrerá num período de crise final, pouco antes da segunda vinda. Os “historistas” pensam que o trecho de 6.1 – 18.24 oferece um esboço cronológico básico do curso da história eclesiástica do século I (6.1) até a segunda vinda (18.11). Os “Simbólicos” ou “Idealistas” acham que as cenas do Apocalipse não descrevem eventos específicos, mas princípios de guerras espirituais. Estes princípios estão em operação no transcurso da era eclesiástica e podem ser alvo de repetições análogas. A verdadeira interpretação se encontra, provavelmente, em uma combinação destes pontos de vista.
Outra discussão calorosa, que não discutiremos, tem se dado sobre o milênio, ou período de mil anos do reinado de Cristo descrito em 20.1-10, e que é entendido de várias maneiras pelos intérpretes. São três correntes nesse campo interpretativo: os “pré-milenistas”, os “amilenistas” e os “pós-milenistas”.[3]
Quando se fala no “Livro do Apocalipse” a primeira impressão que vem a nossa mente é que estamos falando de um Livro de mistérios. Gordon D. Free diz:


“Sentimos que estamos entrando num país estrangeiro”...chegamos a um Livro cheio de anjos, trombetas, terremotos, bestas, dragões, e abismos sem fundo... há um simbolismo rico e diverso, parte do qual pode ser absorvido (o julgamento na forma de um terremoto; 6.12-17), ao passo que parte é obscura (as duas testemunhas; 11.1-10). A maioria dos problemas tem sua origem nos símbolos, além do fato de que o Livro trata dos eventos futuros, mas ao mesmo tempo o contexto é reconhecidamente do século I... parece necessário dizer, logo de inicio, que ninguém deve abordar o Apocalipse sem um grau de humildade. [4]


Free também diz que enfrentamos um tipo diferente de problema sobre o tipo literário, porque o Apocalipse é uma combinação sem igual, finamente harmonizada, de três tipos literários distintos: O apocalíptico, a profecia, e a carta. Além disto, o tipo básico, o Apocalipse, é uma forma literária que não existe em nossos dias (p. 218).


Divisão do Livro
A divisão do Apocalipse em sete seções é preferida por muitos autores, embora não haja unanimidades exatos em cada seção.[5] É mais natural e promovida pelo próprio Livro. Hendriksen segue a divisão seguinte:
1. Cristo no meio dos sete candeeiros de ouro (1 – 3).
2. O livro com os sete selos (4 – 7).
3. As sete trombetas do juízo (8 – 11).
4. A mulher e o filho perseguidos pelo dragão e seus auxiliares (a besta prostituta) (12 – 14).
5. As sete taças de ira (15 – 16).
6. A queda da grande prostituta e das bestas (17 – 19).
7. O julgamento do dragão (Satanás) seguido pelo novo céu e nova terra, a Jerusalém (20 – 22).
Para muitos comentaristas, essas sete seções se encaixam em dois grupos. No primeiro (1 – 11) vemos a luta entre os homens, isto é, entre crentes e incrédulos. O mundo ataca a Igreja, mas a Igreja é vingada, protegida e vitoriosa. No segundo grupo (12 – 22) é-nos mostrado que essa luta na terra tem um pano de fundo mais denso. É a manifestação visível do ataque do diabo ao filho nascido. O dragão ataca o Cristo.
Observa-se que a primeira divisão contém três seções> 1 – 3; 4 – 7; e 8 – 11. A segunda contém quatro: 12 – 14; 15 – 16; 17 – 19; e 20 – 22. Na primeira vemos a igreja perseguida pelo mundo e na segunda vemos o conflito subjacente entre Cristo e o dragão (Satanás). O livro do Apocalipse, portanto, revela um progresso em profundidade do conflito espiritual.[6]


Conteúdo do Apocalipse
LADD diz: “visto que o livro tem que ser interpretado como um todo, temos que ter um esboço de seu contudo em mente. Ele sugere um esquema que baseia-se na estrutura literária do Livro, que é indicada pela expressão “em espírito” (1.10; 4.2; 17.3; 21.10). O esboço é o seguinte:
Primeira visão (1.9-3.22) – O Cristo Exaltado e suas sete Igrejas. Cristo é visto em pé, em meio a sete candeeiros (1.12 e s.), simbolizando sua superintendência na vida das suas igrejas na terra. As cartas às sete Igrejas (2-3) são sete cartas reais na Ásia Menor. Nestas cartas, está a mensagem de Cristo para sua Igreja em todos os tempos.
A segunda visão (4.1-16-21) retrata o trono celestial com um livro selado com sete selos na mão de Deus. Este só pode só ser aberto pelo Leão da tribo de Judá, que é o Cordeiro de Deus sacrificado (4.1-11). Segue uma série de tripla de sete: a abertura dos sete selos (5.1-8.1), o toque das sete trombetas (8.2-9.21) e o esvaziamento das sete taças (15.1-16.21). Segue uma representação simbólica dos acontecimentos na terra.
A terceira visão (17.1-21.8) é a grande prostituta, Babilônia (17.1-5), a grande cidade, que tem domínio sobre todos os reis da terra (17.18). O julgamento e a destruição da Babilônia são anunciados e retratados (18.1-24), seguido por um hino de louvor, por sua destruição (19.1-5). O restante da visão retrata a vitória final de Deus sobre todos os poderes do mal.
Uma visão final retrata a Jerusalém celestial, que é a noiva, esposa do Cordeiro (21.9-22.5). O livro termina com um epílogo (22.6-21), convidando os homens a receberem a dádiva da vida por parte de Deus (22.17).[7]
Teologicamente, há muito que comentar sobre o Livro do Apocalipse, porém resumiremos no “cordão dourado” que, segundo Van Groningen, consiste em três fios unificados e integrantes que são: o reino (que inclui o rei, o trono, o reinado e o domínio), a Aliança em sua totalidade criacional/redentora/restauradora e o agente Mediador da aliança.[8]
Na visão de abertura, Cristo aparece como o Rei e Juiz majestoso do universo e o Soberano das igrejas, (1.12-20). Do capítulo 4.1 ao 5.14, Deus aparece numa bela cena de adoração como o Rei do Céu e da terra. Está rodeado de seres angelicais (5.1 com 1Rs 22.19).
O seu governo (Reino) foi estabelecido na criação (4.11), é exercido na história (6.1 – 22.5), é conduzido à plenitude através do Cordeiro (cap. 5; 22.1). Os santos participam do governo de Deus e no futuro reinarão com Ele (1.6; 2.26-27; 3.21; 5.10; 20.4,6)[9]. O livro nos revela os princípios de governo moral divino, sempre operantes em qualquer época que vivamos, podemos ver a mão de Deus na História, e seu braço poderoso protegendo-nos e dando-nos a vitória por meio de nosso Senhor Jesus Cristo. O livro é uma revelação do plano de Deus para a História do mundo, especialmente da Igreja. O termo “trono” ocorre dezessete vezes nos capítulos 4-5. Esse trono não está na terra, mas no céu onde se encontra o Santo dos santos do templo celestial tal como estava na arca da aliança (Ex 25.22).
O Mediador entronizado em glória, recebeu de Deus o plano para a história. Vemos isso no capítulo 5.1-7, quando João ver o “Filho do Homem glorificado”,cai aos seus pés como que morto (1.17), e ouve a voz suave do Salvador dizendo: não temas... Eu sou contigo. No meio da provação e da tribulação, podemos por os nossos olhos fixos naquele que é o Rei dos reis e Senhor dosa senhores. A descrição do capítulo 5 é que “ninguém fora achado digno de abrir o livro, nem de o ler, nem de olhar para ele. E disse-me um dos anciãos: Não chores; eis aqui o Leão da tribo de Judá, a raiz de Davi, que venceu, para abrir o livro e desatar os seus sete selos”. (5.4-5). O trono agora é de Deus e do Cordeiro (22.1). Deus governa o cosmo por meio do Cordeiro. Canta-se o hino da redenção por esse governo: “Digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o teu sangue compraste para Deus homens de toda a tribo, e língua, e povo, e nação; E para o nosso Deus os fizeste reis e sacerdotes; e eles reinarão sobre a terra”.
João não vê o próprio céu, mas uma figura simbólica (...a arca da sua aliança foi vista no seu templo [11.19]). Nessa figura, o santuário de Deus no céu está, agora, totalmente aberto. A arca da aliança, por tanto tempo longe dos olhos, é agora vista. Essa arca da aliança é o símbolo da comunhão superlativamente real, íntima e perita entre Deus e seu povo – uma comunhão baseada na expiação. Quando essa arca é vista (plenamente revelada), o pacto da graça (Gn 17.7) é cumprido na totalidade da sua doçura no coração e na vida dos filhos de Deus. [10]
O apóstolo ouve um som vindo do céu: E cantavam um como cântico novo diante do trono, e diante dos quatro animais e dos anciãos; e ninguém podia aprender aquele cântico, senão os cento e quarenta e quatro mil que foram comprados da terra. Cada um dos remidos canta esse cântico diante do trono sobre o qual se assentam Deus e o Cordeiro.
E, depois destas coisas ouvi no céu como que uma grande voz de uma grande multidão, que dizia: Aleluia! Salvação, e glória, e honra, e poder pertencem ao Senhor nosso Deus; Porque verdadeiros e justos são os seus juízos... Regozijemo-nos, e alegremo-nos, e demos-lhe glória; porque vindas são as bodas do Cordeiro, e já a sua esposa se aprontou. (19.1, 2, 7).
“E vi um novo céu, e uma nova terra. Porque já o primeiro céu e a primeira terra assaram, e o mar já não existe” (21.1). Aqui está à completude criacional de Deus. O Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim, estará reinando eternamente e com ele, o vencedor, herdará todas as coisas; e Deus será o seu Deus, e ele será seu filho. Bem-aventurados aqueles que guardam os seus mandamentos, para que tenham direito à árvore da vida, e possam entrar na cidade pelas portas... e reinarão para todo o sempre.


Resumo do Mitte
O Reino é visto claramente em textos como descrito no capítulo 4.2,10; 5.10-13.
O Mediador é visto em textos como Ap. 5.1-9; 19.15,16. O Rei Regerá com cetro de Ferro.
A visão das bênçãos do novo Mundo (Ap 21.1-22.5). Tudo que era promessa da Aliança, agora se torna realidade. (ver 7.4-9)


BIBLIOGRAFIA


LADD, George Eldon. TEOLOGIA DO NOVO TESTAMENTO. Editora HAGNOS. São Paulo, SP. 2002. p. 584.
HENDRIKSEN, William. MAIS QUE VENCEDORES. Os Mistérios do Apocalipse desvendados com profundidade e fidelidade. Cultura Cristã. São Paulo, SP. 1ª edição 2001. p. 288.
FREE, Gordon & STUART, Douglas. ENTENDES O QUE LÊS? Vida Nova. São Paulo, SP. 2008. p.330.
RIBEIRO, Jonas Celestino. Toda a Bíblia Em Um Ano – De Gênesis a Apocalipse. Edições Vida Plena. Rio de Janeiro,RJ.1998. 207 p.
BÍBLIA DE ESTUDO DE GENEBRA. Sociedade Bíblica do Brasil & Cultura Cristã. São Paulo, SP. 1999. 




[1] Teologia do Novo Testamento de George Eldon Ladd – Hagnos. Reimpressão; 2002. p. 573
[2] Mais Que Vencedores de Willian Hendriksen. Cultura Cristã. p. 25.
[3] Bíblia de Estudo de Genebra – SBB e Cultura Cristã. 2007. p. 1524
[4] Entendes o que Lês? Gordon D. Free & Douglas Stuart – Vida Nova. 2008. p. 217.
[5] Os diversos sistemas de divisão nessas sete seções serão encontradas em L. Berkhof, op. cit., p. 339.
[6] Mais Que Vencedores de Willian Hendriksen. Cultura Cristã. pp. 34-36.
[7] Ibidem a
[8] Criação e Consumação II. G. Van Groningen. Cultura Cristã. 2006. p. 38.
[9] Notas da Bíblia de estudo de Genebra.
[10] Ibidem I